13/08/2018 as 08:13

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EDITORIAL: Tem que meter a colher!

Se a sociedade não interfere, é sinal de que essa sociedade acredita que a questão da violência contra a mulher é normal.

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O aumento expressivo de casos de violência contra a mulher pede medidas protetivas. Há um aumento de ações, na própria sociedade para denunciar e combater o feminicídio. A mais recente trata de derrubar tabus machistas como o que diz “em briga de marido e mulher, ninguém mete a colher”. Mete a colher, sim.


Há conquistas, mas ainda há um caminho longo a percorrer. Especialistas e profissionais que atuam na rede de proteção dos direitos das mulheres comemoraram a criminalização de abusos sexuais e atos libidinosos cometidos em locais e transportes públicos, além da divulgação de cenas de estupro.


Uma dessas conquistas é a aprovação do projeto que altera a legislação penal brasileira, ampliando o rol de atos considerados crimes cometidos contra a dignidade sexual. A expectativa de operadores jurídicos e de organizações da sociedade civil é de que as penas previstas possam ter um efeito de inibição das práticas criminosas e punição mais adequada dos agressores.


O projeto ampliou a identificação de crimes que antes era constrangedor mencionar, porque não havia registro no Código Penal. É preciso agora redefinir critérios de denúncia, de fiscalização e, consequentemente, de atuação, tanto das políticas públicas quanto da sociedade.


O projeto é a definição de agravamento das penas previstas para casos de estupro coletivo, quando é cometido por vários agressores, e do chamado estupro corretivo, que geralmente é cometido por motivação homofóbica. A dificuldade de punir comportamentos libidinosos praticados em público com a gravidade devida foi escancarada no caso do homem que ejaculou em uma mulher dentro de um ônibus em São Paulo, no ano passado.


A inovação da lei é fundamental para que o país não trate mais dessas questões de forma moralista, mas com respeito aos direitos das mulheres. Esse aspecto jurídico fortalece a luta das mulheres no que se refere à ideia e ao valor do reconhecimento da condição feminina enquanto cidadã.


A legislação penal é parte dessa transformação da cultura, mas sem a mudança de consciência da sociedade, a lei sozinha não tem poder para interromper todo o ciclo de violência cometida contra a mulher. As mulheres ainda hoje são mortas, são estupradas, não são resguardadas em seus direitos humanos mais básicos. O direito penal deve estar atento à realidade, mas também é preciso a adoção de novas posturas.


Não adianta uma lei que estabelece que matar mulher por circunstância de gênero é feminicídio. Se uma mulher gritar por socorro na presença de câmeras e vizinhos, como ocorreu recentemente com a advogada morta supostamente pelo marido no Paraná, é preciso interferir. Tem que meter a colher! Se a sociedade não interfere, é sinal de que essa sociedade acredita que a questão da violência contra a mulher é normal ou uma questão familiar, não é uma questão de Estado e de responsabilidade nossa, da sociedade.


A punição adequada e a adoção a conscientização da sociedade contribuem para evitar o agravamento da violência contra a mulher e casos de feminicídio.