18/09/2018 as 07:36

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O atentado a Bolsonaro e as consequências jurídicas da motivação do crime



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Por não termos precedente e sermos reconhecidos como uma nação pacífica, as cenas lamentáveis e antidemocráticas que assistimos na véspera do dia da Independência contra o candidato a Presidência da República Jair Bolsonaro, em Juiz de Fora/MG, nos remetem ao assassinato do Ex-Presidente americano John Kennedy, em 22 novembro de 1963, na Cidade de Dallas, Estado americano do Texas.


A princípio vislumbrávamos naquela conduta uma tentativa de homicídio qualificado pelo motivo torpe (ódio político) e pela dissimulação (uma vez que o autor se aproxima simulando admiração pelo político vitimado e o golpeia com a faca de forma absolutamente inesperada e covarde), elencados no artigo 121, § 2º, I e IV, combinado com o art. 14, II, CP em que a pena, que flutuaria de 12 a 30 anos de reclusão, seria minorada de 1/3 a 2/3, visto que o homicídio não teria sido consumado.


Entretanto, após uma análise mais detida chegamos a conclusão de que há um conflito aparente de normas a ser resolvido pelo Princípio da Especialidade, nos exatos termos do art. 12 do Código Penal: “As regras gerais deste Código aplicam-se aos fatos incriminadores por lei especial, se esta não dispuser de modo diverso.”


Ou seja, a tentativa de homicídio qualificado resta afastada em razão do princípio citado, tendo em vista o caráter especial da norma da Lei de Segurança Nacional (Lei 7.170/83). Imperativo, portanto, a aplicação do artigo 20, §único, da supracitada lei, “praticar atentado pessoal” já que o criminoso praticou um atentado pessoal com resultado lesão corporal grave, ensejando um aumento de pena que pode chegar ao dobro. Em números: a pena original que é de reclusão de 03 a 10 anos, com o resultado mais grave (lesão corporal grave) pode chegar a reclusão de 06 a 20 anos.


Os crimes políticos estão previstos na já mencionada lei e se caracterizam pela lesão ou exposição a perigo de lesão: a) da integridade territorial e da soberania nacional; b) do regime representativo e democrático, da Federação e do Estado de Direito; c) da pessoa dos Chefes dos Poderes da União.


 Não nos resta dúvida de que a conduta do criminoso foi voltada à burla do regime “representativo e democrático” e não à vida do candidato propriamente dita, pois visava claramente influir na eleição pela eliminação física de um oponente, de forma que sua motivação e objetivos, bem como a lesão aos bens jurídicos tutelados pela lei em comento, satisfeitos integralmente os requisitos dos artigos 1˚e 2˚ do mesmo diploma legal.


As investigações ficarão então a cargo da Policia Federal (artigo 144, I e § 1º, I e IV, CF) e a Competência será da Justiça Comum Federal, como preceitua o artigo 109, IV da CF/88, processar e julgar os “crimes políticos” e as “infrações penais praticadas em detrimento de interesse da União”.


Por via de consequência, não há falar na Competência do Tribunal do Júri, já que a conduta praticada não está elencada entre as hipóteses do art. 5˚, XXXVIII da nossa Carta Política, que prevê apenas os crimes dolosos contra a vida (artigos 121 a 126 do Código Penal).


Convém, por fim, ressaltar que não cabe neste caso o recurso de apelação contra eventual sentença absolutória ou condenatória, a ser julgada pelo Tribunal Regional Federal da 1ª Região. O recurso cabível é Recurso Ordinário Constitucional, de Competência do Supremo Tribunal Federal, que nesse caso, funcionará como segunda e última instância, um verdadeiro Tribunal de Apelação, a teor do art. 102, II, “b” da Constituição Federal.

Fábio Guilherme Farias e Sthefane Salmeron/advogado criminalista