30/10/2018 as 09:55

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Apartheid digital e a fábrica de intolerantes



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É de conhecimento comum que a internet reduziu as distâncias e aproximou as pessoas. O tráfego de mensagens e o compartilhamento de informações se tornou constante e incontrolável. O que muita gente ainda não sabe é como a internet e as redes sociais também apartaram relacionamentos.


As redes sociais apresentam as informações a cada usuário de maneira personalizada. Seus algoritmos – sequências lógico-matemáticas – são programados para lhe apresentar os conteúdos nos quais você já demonstrou interesse, como os quais você já interagiu. Sempre mais do mesmo.


Dessa forma, a ideia geral das redes sociais é capturar os dados da sua navegação na internet, entender o seu comportamento rotineiro e te oferecer coisas ou pessoas com as quais você teria mais afinidade de comprar ou se relacionar. Com isso são formadas as chamadas “bolhas digitais”, ou seja, grupos ou clusters que possuem o mesmo padrão de consumo e interesse.


A pergunta que fica é: nesse sistema, onde fica a diversidade e o diálogo entre os diferentes? Da maneira com que os algoritmos estão sendo aperfeiçoados, a tendência é haver uma maior clusterização ou agrupamento de pessoas iguais, reforçando opiniões e ideias semelhantes.


Essa repetição de ideias prejudica a ponderação, a empatia e o raciocínio crítico. “Uma mentira repetida mil vezes se torna uma verdade”, já diria o nazista Goebbels.


A mentira aqui consiste em fazer as pessoas acreditarem que suas ideias são uma premissa absoluta, o fortalecimento do viés de confirmação, a teoria psicológica segundo a qual nós tendemos a dar atenção apenas aos dados que reforçam nossa visão de mundo pré-concebida.


Em verdade, a internet uniu as pessoas, mas também as agrupou, separou e as categorizou. Essas bolhas têm forte participação no aprofundamento dos abismos ideológicos no Brasil e no mundo, destruindo os consensos e levando às pessoas de esquerda ou direta apenas informações que confirmam suas posições.


Nós, profissionais da Ciência Política, nos preocupamos em vislumbrar as implicações sociais que tal evolução digital causará na sociedade. Para termos um país mais livre, democrático e justo temos que promover a diversidade.


A diversidade é rica e gera inovações em todos os aspectos. Uma sociedade democrática terá que romper a bolha da zona de conforto ideológico e permitir ouvir os diferentes, pois somente assim teremos o respeito e o ambiente estável que precede o progresso de qualquer organização social.

Leonardo Volpatti e Fábio Monteiro Lima/ cientista político* e advogado eleitoral**