12/11/2018 as 07:41

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EDITORIAL: Para onde vamos?

Num momento em que os professores estão se tornando inimigos públicos número um, é preciso ter cuidado.

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Mais uma vez a educação é alvo de discussão, e polêmica, envolvendo o presidente eleito Jair Bolsonaro. O conteúdo das provas do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) desagradou. Segundo ele, o governo não permitirá a inclusão de determinadas questões no exame nacional. As questões a que se refere é a do caderno de linguagens que, no enunciado, mencionava o “pajubá, dialeto secreto de gays e travestis” como exemplo de patrimônio linguístico.


Bolsonaro desaprovou e tratou o tema como ideologia de gênero nas escolas. A educação, para ele, deve se preocupar em “ensinar”. “Que importância tem ideologia de gênero?”. “Quem ensina sexo é papai e mamãe”, explicou. É essa a abordagem que o presidente eleito deseja, um defensor da proposta de gravar professores considerados “doutrinadores”.


O Exame Nacional do Ensino Médio aplicou as provas de linguagem, ciências humanas e redação. Alguns temas abordados foram a Declaração Universal dos Direitos Humanos, racismo, ditadura militar e violência contra a mulher.


O Enem também incluiu o trecho de uma matéria de jornal que cita a “intolerância do internauta” brasileiro, traduzida em mensagens de racismo, posicionamento político e homofobia. O racismo também foi abordado em um poema que aborda o discurso racista internalizado na sociedade.


Outro assunto que causou polêmica foi a ditadura militar, tema na prova de ciências humanas. O exame reproduziu a carta do cartunista Henfil ao presidente Ernesto Geisel escrita em 1979. Na carta, Henfil declara a devolução do seu passaporte, uma vez que os passaportes de outras oito pessoas, dentre elas Leonel Brizola e Miguel Arraes, tinham sido negados.


Na verdade, o Enem manteve o padrão das provas dos últimos anos. São provas de diversos textos ligados a questões sociais bastante relevantes, como imagem da mulher, preconceito em relação à mulher, racismo. O tema da redação, “Manipulação do comportamento do usuário pelo controle de dados na internet”, não foi influenciado pelos recentes episódios envolvendo notícias falsas nas eleições, mas acabou sendo um tema oportuno. Mas a escolha do tema ocorreu no meio do ano.


Os temas abordados pelo Enem sempre são extremamente atuais e relevantes. Para os jovens estudantes que estão informados da discussão de fake news, do papel da internet na informação, é muito importante esse debate. O próprio presidente Michel Temer e o ministro da Segurança Pública, Raul Jungmann, elogiaram a escolha do tema. “Cumprimentei os organizadores pelo título da prova [redação]. Trata das notícias falsas, é um tema atualíssimo”, disse o presidente.


O Enem abordou as fake news em sua prova, ao mesmo tempo em que foi alvo delas. Circulou nas redes sociais uma notícia falsa de que o exame foi cancelado e o Inep teve que ir a público desmentir a informação. Num momento em que os professores estão se tornando inimigos públicos número um, é preciso ter cuidado. Não podemos retroceder.