21/11/2018 as 10:41

Consciência Negra

Danilo Buarque Couto Publicitário e advogado. A escravidão dos negros no Brasil é uma enorme mácula da história do nosso país e que reflete, social e negativamente.

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Em 20 de novembro celebra-se o Dia da Consciência Negra em nosso país. Apesar de sua criação em 2003, apenas em 2011 a data foi oficialmente instituída em âmbito nacional com o advento da lei nº 12.519. A gentileza em se dedicar um dia à reflexão da participação do negro na sociedade brasileira, não chega nem de longe a minimizar a crueldade de tudo o que já foi feito contra esse grupo étnico em solo brasileiro, desde a colonização até hoje. Mas porque foi escolhida essa data? Justamente para homenagear Zumbi, o mais conhecido dos líderes do Quilombo dos Palmares/AL, morto em 20 de novembro de 1695, personalidade-marco da resistência e luta contra a escravidão no Brasil.


A escravidão dos negros no Brasil é uma enorme mácula da história do nosso país e que reflete, social e negativamente, até os dias atuais (amargamos, inclusive, o triste título de ser o último país das Américas a abolir a escravidão em 1888). Esses reflexos negativos de tratar o negro como raça inferior são percebidos, de maneira explícita ou implícita, em nosso convívio social. A verdade, é que somos um verdadeiro povo racista, porém, hipócrita a ponto de não admitir esse racismo velado do nosso cotidiano. Uma atitude triplamente ignorante: primeiro, por discriminar alguém em decorrência da cor da pele; segundo, por desconhecer que inexiste uma raça “pura”; e terceiro pela hipocrisia em si de não reconhecer isso. Precisa-se entender que nós brasileiros somos todos pardos! Uma grande mistura entre índios, brancos, negros e orientais.


É notório que esta nefasta descriminação racial, iniciada no Brasil colônia, perdura até os dias atuais e infelizmente já se incorporou a nossa “cultura”. E o pior, não se discrimina só àqueles de cor preta (Segundo estudiosos, dizer cor negra é equivocado!), como também os de cor branca, amarela e vermelha. São inúmeros os exemplos de atitudes e pensamentos preconceituosos, de todos os lados: do negro que só gosta de namorar brancas loiras ao branco subordinado que olha com desdém para a chefa mulata; da pessoa que atravessa a rua por ver um negro vindo em sua direção à polícia que prende o negro e libera o branco; do branco que injuria o negro o chamando de “macaco” ao negro que retruca com “branquelo transparente”; do que diz: vou sair para pegar as “nêgas”, ao que fala: vocês que são brancos que se entendam!; do “japonês, chinês ou coreano é tudo a mesma coisa” ao “até que é um negro inteligente!”; entre tantos outros...

Mas afinal, nesse cenário de segregação racial, para quem se destina o dia da Consciência Negra? De pronto vem à mente a resposta: aos negros, obviamente! Para eles comemorarem um dia de orgulho da cor da sua pele e para relembrar que são igualmente livres como qualquer membro da nossa sociedade. Sinceramente não acredito que seja “aos negros” a resposta dessa pergunta, tampouco, para conscientizar os que se dizem brancos! Esse dia se destina a todos os membros da nossa sociedade racista, inclusive, os próprios negros, discriminantes, discriminados ou não. Dessa feita, deveria ser uma data com sentido mais amplo, na busca e concretização, por negros ou não, de sentimentos de igualdade e irmandade.

Pois bem, teoricamente, é certo e fácil pensarmos em isonomia, entretanto, na prática, o que fazer com centenas de anos de desigualdade no tratamento aos negros, evidenciados na falta de acesso e oportunidades para estudar e trabalhar? Eis que surgem como paliativo as Ações Afirmativas! Uma excelente opção para compensar, com um pouco de igualdade, um histórico de diferenças sociais discriminatórias do nosso país. Acontece que no Brasil, onde a corrupção, os interesses individuais e a falta de fiscalização preponderam, já era de se esperar que essas Ações não funcionassem a contento. Assim, o que era para ter um caráter altruísta cede lugar a fins eleitoreiros, senão vejamos: o que foi feito na melhoria da educação brasileira para que futuramente os afrodescendentes não venham a precisar de cotas? Nada de relevante e eficiente! Nesse talante, se aqueles que são negros aceitam as benesses em razão da cor, sem reivindicar melhorias para todos, estão sendo preconceituosos da mesma maneira, para com os outros e para consigo mesmos, mascarando o problema e gerando uma discriminação às avessas.


Finalmente, o dia da Consciência Negra é, sem dúvida, uma ótima oportunidade para exibir cabelos Black Power; usar turbantes; professar publicamente adesão a religiões de origem africana; demonstrar a riqueza cultural negra na dança, na música e na alimentação; reconhecer uns poucos negros como destaques na sociedade ou lamentar da esmagadora maioria negra discriminada, porém, acredito que deveria trazer algo além desse orgulho e consciência negra. Destarte, de que interessa sermos orgulhosos e conscientes que somos negros ou brancos, se não compreendemos que somos todos Humanos? Nesse sentido, a meu ver, a solução dessa segregação está ao nosso alcance e é bem simplória, basta fecharmos os olhos, literalmente, e nessa escuridão, enxergar a real consciência negra, a consciência de acabar com a discriminação racial que está dentro de cada um de nós.