26/09/2019 as 08:58
JOGOS DE TABULEIROCoordenadora apostou no retorno dos jogos de tabuleiro como atividade educativa e o alunado ganhou em aprendizado, criatividade e interação
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Propor aos alunos de uma geração intimamente engajada à expansão exponencial da internet e dos aparelhos tecnológicos, um movimento contrário, isto é, algo analógico e presencial, pode ser confundido com saudosismo ou, para os mais críticos, um retrocesso. Ledo engano. A coordenadora do Ensino Médio do Colégio Coesi, Izabella Matos, 38 anos, apostou no retorno dos jogos de tabuleiro como atividade educativa e o alunado ganhou em aprendizado, criatividade e interação.
“A primeira ideia foi tirar um pouco os meninos do eletrônico para os jogos de tabuleiro, que estavam esquecidos, e promover uma maior interação entre eles”, explica a professora Izabella. Ela e o professor Rodrigo Seixas, 39 anos, são responsáveis pelo projeto intitulado Board Game Day, que na última quinta-feira,19, foi para a sua terceira edição. O projeto acolhe não só os alunos do Coesi como também o público externo convidado.
Mas como fazer o aluno deixar, por algumas horas, o smartphone, o tablet e o computador, com seus jogos eletrônicos, para experimentar os jogos presenciais? A criação de um espaço deles, onde são desenvolvidas todas as atividades, foi o primeiro passo nesse processo, que teve o apoio incondicional da direção do colégio. “Era preciso criar a sensação de pertencimento, de que aquele projeto era deles, e nada melhor do que eles próprios cuidarem da ambientação desse espaço para os jogos, com a linguagem deles”, opina a professora Izabella.
Ex-aluna e, hoje, professora da instituição, Izabella conhece bem o significado de pertencimento. Para ela, o Coesi é sua segunda casa. Pode-se dizer, uma extensão da sua casa, já que sempre morou a uma quadra da escola. “Eu me lembro de quando o colégio era uma casinha de esquina, aqui, no Conjunto Leite Neto, e eu vinha a pé com minha mãe. Estudei aqui desde os dois anos e meio”, revela. De volta ao ponto de partida, desta vez como coordenadora, Izabella tenta mostrar aos alunos como é importante interagir entre eles e criar vínculos no local onde passam a maior parte do dia.
Ao que tudo indica, os alunos entenderam o propósito. Foi realizada uma votação e elegeram o tema main crafting (os bonequinhos dos jogos de vídeo game) para a decoração do espaço deles. Cada parte do boneco é feito por pequenos quadradinhos coloridos. Os alunos fizeram o desenho manualmente e plotaram as paredes. Com formação em matemática, Izabella aproveitou a plotagem para exercitar um dos assuntos vistos em sala de aula: “É muito melhor para o aluno aprender o assunto de matriz matemática na forma de uma produção artística dele, enquanto está montando o boneco que ele mesmo desenhou”, explica.
Que comecem os jogos!
Os alunos se dividem assim que definem o jogo que mais interessa a cada um. Eles se dirigem às mesas, cada uma com a cor que representa um tipo de jogo, leem as instruções e começam a jogar. Há jogos que permitem até 15 participantes ao mesmo tempo. O professor fica como espectador e também para auxiliá-los em caso de dúvida.
A ideia, de acordo com o professor Rodrigo Seixas, é desenvolver o protagonismo do aluno durante todo o processo do jogo. Eles aprendem a interpretar as instruções de cada jogo e tentam desenvolver todas as atividades solicitadas com o máximo de autonomia.
Na segunda etapa, os alunos não encontram o jogo pronto na mesa, eles terão que produzir o próprio jogo. A proposta é que eles produzam os jogos em cima de temáticas do seu dia a dia em sala de aula. Eles criam os mecanismos, isto é, as regras, desenham e depois praticam. A produção é feita durante as aulas de Artes, do professor Rodrigo Seixas.
Para o professor, esse é um dos momentos mais criativos do processo, quando surgem gratas surpresas: “Aqueles alunos mais tímidos, que não conversavam com ninguém, que ficavam meio escondidos, acabam sendo descobertos. Lembro que pedi a uma dessas alunas, a Ana Beatriz, um desenho pela manhã e, à noite, ela e um grupo de colegas me enviaram dezesseis artes incríveis”, conta orgulhoso, o mestre.
Já na terceira e última etapa do projeto, os alunos vão levar a produção deles e ensinar os jogos para estudantes de uma escola pública, além de ajudá-los a produzirem os seus próprios jogos. De acordo com os organizadores do evento, a finalização está prevista para acontecer até novembro deste ano e deverá acontecer numa escola pública indígena, no município de Porto da Folha.
Interação
A primeira experiência do Board Game Day, no início do ano passado, obteve baixa adesão − cerca de 50 alunos participaram, o que não corresponde a 25% dos alunos do Ensino Médio do Coesi. Os organizadores viram a necessidade de reformular o projeto, mudaram, e na segunda edição contaram com 80% dos alunos, além de convidados.
− Percebemos que alguns não tinham muita afinidade com jogos, mas gostavam de dançar e de representar. Aí, incluímos além da ambientação da sala pelos alunos e os jogos, outras atividades. No segundo Board Game, além dos jogos, eles dançaram, cantaram e representaram no palco. Abrimos também um concurso de Cosplay, então, isso, aqui, ferveu! – lembra, a coordenadora Izabella Matos.
À medida que os alunos foram conquistados pelos jogos, houve uma interação maior entre eles, inclusive, fora da sala de aula, segundo a coordenadora: “Tenho relatos de pais parabenizando a escola pela proposta, porque seus filhos passaram a jogar com os amigos em suas casas. Aqueles jogos antigos que os pais se reuniam para jogar na época deles e que estavam esquecidos. Hoje, eles estão brincando e interagindo juntos, pais e filhos”.
Ela destaca ainda que há vários exemplos de como o Board Game Day está sendo importante para a interação dos alunos. “Uma aluna do segundo ano do ensino médio, a Náthane, representa bem isso. Extremamente tímida, ela nos surpreendeu no Cosplay: representou, dançou junto com os demais e, depois desse momento, passou a se relacionar de forma diferente com a turma”, relata.
O fato do Board Game Day ser aberto a convidados é outro ponto positivo: “Quando o aluno vem acompanhado ao Board Game, ele fica mais à vontade para participar das atividades, quebra aquela timidez inicial, principalmente dos novatos”, conclui a coordenadora.
O retorno aos jogos de tabuleiro, mais que uma brincadeira, tornou-se uma atividade educativa para desenvolver o protagonismo e promover a interação dos alunos dessa geração Z, que muito sabe, mas que muito tem a aprender sobre relações interpessoais.
| Reportagem: Deise Dias
|| Fotos: Divulgação