06/08/2018 as 10:00

Entrevista

“O Sarau no Coreto marca um divisor de águas em Monte Alegre”

No desafio de transformar uma comunidade a partir do reconhecimento da identidade cultural, Carlos Alexandre Nascimento Aragão, professor de Língua Portuguesa da rede estadual de Sergipe, juntou-se ao músico Matheus Borges, pensou na teoria um projeto de incentivo à cultura no município de Monte Alegre, no Alto Sertão, e colocou em prática com outras mãos jovens estudantis e adultas cabecinhas fervilhantes. É o Sarau no Coreto, que celebrou um ano de existência, com muita literatura, música e outras tantas manifestações artísticas. Leia e saiba mais sobre o que anda acontecendo no interior do estado. Boa Leitura!

COMPARTILHE ESTA NOTÍCIA

JORNAL DA CIDADE - O que é, como e onde é realizado o Sarau no Coreto?
CARLOS ALEXANDRE - Foi em 15 de julho de 2017que ocorreu a 1ª edição do Sarau no Coreto, um momento cultural onde todas as manifestações artísticas e populares do município de Monte Alegre (SE), situado no Alto Sertão sergipano, têm o seu espaço. Eu e o músico Matheus Borges pensamos nesse projeto com o intuito de movimentarmos este espaço público em prol do resgate, valorização, revelação e incentivo à nossa cultura. Monte Alegre, desde o seu nascer, já traz consigo uma herança cultural. Hoje, vive um momento propício para o desenvolvimento da sua cultura, pois muitos jovens estão engajados em projetos e ações que fortalecem cada dia mais o cenário cultural. Temos escritores, escritoras, cantores, cantoras, compositores, compositoras, músicos, atores, atrizes, artistas plásticos, artesãos, artesãs, aboiadores, contadores de história, cordelistas e telespectadores. O encontro ocorre em um sábado de cada mês. Não há um sábado fixo por conta da agenda dos organizadores. E durante ele, trocamos conhecimento e alegramos o nosso espírito. Sendo assim, contamos com o apoio dos cidadãos/cidadãs monte-alegrenses, pois a cultura é para todos e de todos. Buscamos integrar todos os cidadãos/cidadãs em uma só corrente: a cultura. Acreditamos que ela pode transformar vidas e vidas transformam mundos. Os (as) filhos (as) monte-alegrenses sentir-se-ão ainda mais orgulhosos por viverem nesta terra de encantos culturais. Sabemos que não é necessário dispor de recurso financeiro para realizar tal ação, mas do apoio de parceiros que acreditam na cultura.

JC - Qual o motivo que levou à realização desse projeto?
CA - Monte Alegre de Sergipe é um pacato município e não é provido de espaço de lazer para os seus moradores. A nossa juventude nos finais de semana fica refém da televisão ou de alguma farra. É servido por três belíssimas praças e em uma delas há o Coreto. Pensando em movimentar o cenário cultural e ter mais um atrativo para todos os moradores, em especial, a juventude, criamos este projeto. A ideia foi materializada, porém nos surpreendemos com a aceitação do público. A surpresa deve-se ao fato da não valorização da cultura por uma parcela da sociedade brasileira, mas a juventude, junto com os demais moradores, nos impulsionou a continuar. Hoje, o Sarau no Coreto já faz parte do calendário cultural do município e serve de exemplo para outros municípios implantarem esta ação.

JC - Com um ano de existência, quais desafios e conquistas até o momento?
CA - O Sarau no Coreto sobreviveu/sobreviverá ao tempo, resistindo aos olhares contrários, pois é um espaço de todos, não há lado político, religioso, étnico, sexual etc. Cada cidadão/cidadã tem direito de expressar e expor a sua arte. Não há nenhum cunho financeiro, porque esta ação é movida graças à solidariedade de alguns estudantes, professores, comerciantes, enfim, cidadãos/cidadãs monte-alegrenses. Ao longo de um ano, conquistamos o apoio dos jovens, integrando-os às ações desenvolvidas. Ainda conseguimos dar destaque aos artistas de uma época de ouro do município que estavam esquecidos e desconhecidos por uma parcela da população. Os desafios serão constantes, mas venceremos a todos. Percebemos que é preciso estimular ainda mais o envolvimento das crianças, das famílias e dos artistas locais.

JC - O Sarau no Coreto tem sido palco de revelações de talentos tanto entre os alunos como na comunidade?
CA - O Sarau no Coreto marca um divisor de águas em Monte Alegre de Sergipe, devido ser um espaço democrático. Nesse sentido, os talentos vão sendo aflorados e materializados nas edições do Sarau. Hoje, temos crianças, jovens e adultos que expõem seus textos, canções, reflexões e sua arte de encenar a partir do envolvimento nas edições do Sarau. Ressaltamos que a falta de espaços que oportunizem às nossas crianças, jovens e adultos limita a participação desses nos movimentos culturais.

JC - Qual é a dinâmica do encontro?
CA - A cada edição do Sarau há uma temática que conduz o desenvolvimento das atividades. Às 19h, as atividades são iniciadas com música. Em seguida, os escritores são convidados a apresentarem suas produções relacionadas ao tema. Após esta ação há um debate mais profundo sobre a temática, pois esta sempre está ligada a um fator social. Finalizada a discussão, os escritores voltam a se apresentar e continuamos ouvindo música. Durante esse tempo já discutimos sobre ‘Independência do Brasil’, ‘Criança: o nosso amanhã’, ‘Emancipação Política de Monte Alegre de Sergipe’, ‘Família e Religião’, ‘Reggae’, ‘Capoeira’, ‘Mulher, a Rosa Mais Bela do Jardim da Vida’, ‘Política: a Política Pública desejada por Todos os Cidadãos, ‘Cordel e Meio Ambiente’. Além de promovermos a nossa cultura, ajudamos no processo de formação da consciência cidadã.

JC - O projeto alcançou o objetivo inicial ou ainda tem mais desafios?
CA - Como já foi dito, não sabíamos como a comunidade iria receber a proposta, mas o tempo foi nos mostrando a superação da nossa expectativa. Hoje, o Sarau não está mais no campo da idealização, mas do real. É uma ação cultural do município, promovida por crianças, jovens e adultos, ou seja, pela população. Ainda temos o desafio de integrarmos mais a sociedade e termos uma logística de som e iluminação.

JC - Há novidades vindo por aí nas próximas edições?
CA - No último dia 28 de julho, comemoramos o 1º Aniversário do Sarau no Coreto. Esse projeto vem dando visibilidade ao município no cenário regional, estadual e nacional. Durante as edições, contamos com o apoio dos estudantes recitando poemas, aos quais agradecemos imensamente. Os participantes assistiram monólogo com Joana Melo; um projeto de assistência aos cães de rua foi lançado por Nubia Lafayette e Janison Correia; memória do pastoril foi contada e a roda de capoeira apresentada. Durante esse ano, o sentimento é de gratidão a todos que nos ajudaram na materialização da ideia. Reafirmamos que este não é um espaço de um único ser, mas de todos aqueles que valorizam, incentivam e apoiam as manifestações culturais. Sendo assim, muito está por surgir. Desejamos realizar um Concurso de Poesia e tornar o momento do Sarau em um espaço ainda mais cultural para todos os participantes.

JC - E onde quer chegar o Sarau no Coreto?
CA - O maior desejo já foi alcançado: materializar o Sarau. Agora, buscamos mantê-lo e torná-lo ainda mais em um espaço do artista de ontem, hoje e de amanhã. Queremos ver cada cidadão/cidadã monte-alegrense valorizando e defendendo a sua cultura. Ressaltamos a importância de cada cidadão e o poder público apoiarem este projeto. No Sarau há resgate, valorização, revelação e incentivo ao artista, ator, atriz, escritor, escritora, cantor, cantora, contador de história, ao homem e à mulher que valoriza um Monte Alegre de Sergipe encantador de cultura. Desejamos vida longa ao Sarau no Coreto! E a próxima edição vai acontecerá no dia 25 de agosto, a partir 19h, e todos estão convidados. Convidamos a todos para a próxima edição que acontecerá no dia 25/08/18 às 19h.

JC - Além do Sarau no Coreto, quais outras ações voltadas à cultura são desenvolvidas no município, estimulando a participação de jovens?
CA - Estamos vivendo um momento de luz. Hoje, existem projetos desenvolvidos por professores e amantes da literatura que estimulam crianças, jovens e adultos a adentrarem no universo da leitura e escrita. Temos certa de 80 jovens que desbravaram estes universos e hoje seguem publicando textos em antologias e participando de concursos literários. Há o Encontro de Escritores e Concurso Literário, já na 2ª edição; Concurso de Poesia do Centro de Excelência 28 de Janeiro na 3ª edição; Projeto “Poesia indo à Escola”, que envolve estudantes do Ensino Fundamental e Médio do Centro de Excelência 28 de Janeiro, com objetivo de levar a poesia para as escolas do alto sertão sergipano, desde 2013; Projeto “De Mãos dadas com a Poesia” idealizado e desenvolvido por estudantes do Ensino Médio do Centro de Excelência 28 de Janeiro em uma escola rural, envolvendo estudantes do ensino fundamental menor, desde 2017; Plêiade Cavalo-do-cão, onde a filosofia e a literatura servem de base para reflexões e produção de textos literários, envolvendo jovens estudantes do Ensino Médio e Superior, desde 2017. É nesse mar de oportunidades que a juventude se encontra e desfaz a imagem social de que os jovens não querem nada.

Gilmara Costa/Equipe JC