30/04/2021 as 11:15
MORAR BEMAo financiar um imóvel, o comprador deve ficar atento a alguns aspectos importantes
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O número de endividados no Brasil chegou ao maior patamar em 11 anos, as famílias inadimplentes chegaram a 25,5% no ano passado, é o que afirmam os dados da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC). Diante do cenário que tende a piorar nos próximos meses devido ao agravamento da pandemia, diversas discussões sobre as relações contratuais e a possibilidade de aplicação da “força maior” e da “teoria da imprevisão” como meio de extinção ou revisão de negócios jurídicos, impactou o mercado imobiliário de várias formas, entre elas na alienação fiduciária, mas o que isso significa? Dr. Andress Amadeus, sócio e advogado do Escritório Amadeus & Santos Advogados Associados esclarece todas as dúvidas sobre o assunto.
O regime de contrato de concessão de crédito prevê a alienação fiduciária. “Esse mecanismo é uma garantia facilitadora da concessão do crédito, pois assegura a expropriação extrajudicial do bem imóvel em garantia de forma rápida para o credor. A alienação fiduciária é um recurso utilizado em modalidades de empréstimo e financiamento no qual uma pessoa solicita um crédito e, para transmitir confiança em relação ao pagamento, ou seja, quem pega o crédito transfere ao credor fiduciário a propriedade do bem até que seja feito o pagamento da dívida”, explica Dr. Andress Amadeus.
De acordo com a Lei 9.514 /97, que regula os financiamentos, um atraso das prestações significa que o banco pode começar um procedimento para que a dívida seja executada por via extrajudicial. “Salienta-se a importância em se atentar para o prazo de carência estabelecido no contrato firmado, mas é comum que este seja estipulado em 3 prestações em atraso. Quando isso acontece, o dono do imóvel tem 15 dias para quitar a dívida. Se isso ainda não for possível, o banco retoma o imóvel, de modo a levá-lo para leilão.
Em certos casos, pode ser que o imóvel seja vendido por menos do que o valor da dívida, o que significa que o responsável pelo financiamento ainda deve arcar com o restante”, alerta. Ao financiar um imóvel, o comprador deve ficar atento. “O comprador precisa perguntar ao seu banco o Custo Efetivo Total, ou CET, do financiamento. O CET corresponde a todas as taxas, tarifas, tributos e seguros que são cobrados ao solicitante do financiamento e só com o seu valor em mãos, é possível saber a real quantia que deverá ser desembolsada”, destaca.
Antes de 1998, a contratação de um financiamento era feita com um sistema de hipoteca, que exigia um trâmite mais longo e uma ação judicial para que o comprador perdesse o imóvel. Mas houve mudança na lei há 21 anos. “Com a mudança na lei, a regra agilizou a retomada dos bens, que pode ocorrer em 120 dias. Segundo a Lei de Alienação Fiduciária, o contrato com a instituição financeira deverá estipular com quantas prestações em atraso o banco pode iniciar o procedimento extrajudicial para retomada. Quando o pagamento não acontece, o proprietário recebe uma notificação, avisando que serão concedidos 15 dias para o pagamento do débito na íntegra.
Caso a dívida não seja quitada, é feita a consolidação da propriedade, ou seja, o imóvel passa a pertencer automaticamente ao banco, que envia o imóvel para leilão, mas atenção, se não houve notificação, todo e qualquer ato da instituição sobre o imóvel pode ser questionado e, em alguns casos, anulado na Justiça. Depois da consolidação da retomada, também é necessária uma intimação com a data do leilão do qual o imóvel fará parte, pois o comprador tem direito e preferência de pagar o débito e retomar o bem”, orienta. Nos casos em que a arrematação do imóvel for superior ao saldo devedor do financiamento, o ex-dono do imóvel pode receber algo. “Se o valor arrematado em leilão for superior ao valor da dívida do ex-mutuário, contabilizando nesta dívida todos os valores de despesas do imóvel não pagas e que foram arcadas pelo Banco, o ex-proprietário tem direito a receber essa eventual diferença, inclusive o valor do leiloeiro, que é paga pelo Banco Credor, em prazo de 30 dias após a arrematação”, afirma.
O credor deve ser notificado formalmente por cartório da mora para que possa quitar os débitos e regularizar a situação. “Caso a notificação não tenha ocorrido, ou ocorrido fora do prazo estipulado no instrumento contratual firmado, aconselha-se procurar um advogado para que quaisquer providências tomadas em relação ao bem imóvel sejam questionadas em juízo”, conta. A nova Lei do Distrato Imobiliário sancionada para regulamentar os contratos de aquisição de imóveis em regime de incorporação imobiliária e em parcelamento de solo urbano.
De maneira geral, estabelece parâmetros para a resolução de contrato de compra e venda de imóvel na hipótese de inadimplemento por parte do comprador. “Antes desta nova lei entrar em vigor, o litígio entre o consumidor e a incorporadora era resolvido pelo judiciário. O percentual retido pela incorporadora em caso de desistência do comprador variava entre 10% e 25%. Agora, as coisas ficaram mais claras, já que regras e obrigações entre ambos foram estabelecidas, trazendo maior segurança jurídica às operações comerciais entre as partes”, detalha.
Salienta-se que a principal característica da lei do distrato é estipular a porcentagem do valor que poderá ser retido (cláusula penal) pela incorporadora nos casos de desistência do comprador, assim como forma de pagamento, prazo para entrega, valor da comissão de corretagem, dentre outras coisas. “Destaca-se que em caso de alienação fiduciária com instituições financeiras, a nova lei de distrato não se aplica, pois o adquirente não mais possui relação jurídica com o incorporador no tocante ao valor a ser pago. Quando se trata de financiamento direto com o incorporador (vendedor do empreendimento), existem discussões jurídicas, porém a mais aceita é que o cálculo do valor total do crédito do comprador (alienante) deverá ser regulado pela nova lei”, informa.
Mesmo com a crise não é fácil se livrar das amarras da dívida fruto da alienação fiduciária. “Primeiramente, é necessário esclarecer que se, antes da pandemia, o devedor já se encontrava inadimplente, não se caracteriza a Teoria da Imprevisão. Se foi após ou durante a pandemia, abre-se a possibilidade de discussão de extinção, paralisação ou renegociação de contratos existentes, mas isso depende de caso a caso e robustas provas que devem ser apresentadas. Diante das incertezas de uma demanda judicial, o ideal sempre é a renegociação da dívida, que deve ser realizada por meio de aditamento, posteriormente averbado na matrícula do imóvel”, finaliza.