12/08/2019 as 09:44

EM SÃO DOMINGOS

Cemitérios superlotados causam transtornos à população

Coveiro revela que mortos estão sendo amontoados um em cima do outro. Denúncia anônima diz que restos mortais estão sendo jogados no lixão da cidade

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Além da dor da perda, familiares do município de São Domingos, distante 76 quilômetros da capital, têm que lidar com a falta de espaço e de respeito para enterrar seus entes queridos. Com pouco mais de 10 mil habitantes, de acordo com o último censo, a cidade vem passando por um problema social e até de saúde pública. A população cresceu e os dois únicos cemitérios municipais há anos que não passam por uma reforma, e as pessoas têm ficado à mercê da boa vontade de amigos para poder sepultar os mortos em covas emprestadas. Mas, atualmente, nem com essa ajuda a comunidade vem podendo contar.  

O próprio coveiro dos dois cemitérios públicos da cidade denuncia que os ossos enterrados estão sendo retirados dos túmulos sem autorização. “Quando chega na época de tirar os ossos, eu abro a cova, retiro o caixão, boto para dentro de novo só os ossos, e coloco o novo caixão dentro da cova. A cova é funda, são sete palmos e eu cavo sozinho. No mesmo lugar que eu tiro um, eu boto outro, e as carneiras também estão todas lotadas”, conta Gilvan de Afonso, que garante ser o único coveiro do município.

O coveiro ainda relata que com a epidemia da dengue, o número de mortos aumentou e ele se viu em situação desesperadora. “Já enterrei sozinho 30 corpos em três semanas. A Chikungunya matou muito velhinho aqui. Foi botando um em cima do outro mesmo. Quando eu vou abrir uma cova, analiso onde vou meter a picareta, e aqui não tem nenhum canto pra não ser um em cima do outro. Quando morre alguém e a família procura, eu tenho que dar meus pulos, cavando em cima, por exemplo. E isso acontece nos dois cemitérios, que já estão cheios e eu venho avisando direto ao prefeito”, lamenta.

Além de toda a problemática com a falta de espaço, Gilvan também revela que o trabalho que ele faz é pesado para um coveiro só. “Eu já falei que preciso de uma pessoa pra me ajudar. É suado, cavar cova não é fácil. Eu já trabalhei até de noite, três covas numa noite, só uma que foi na gaveta, o resto foi tudo buraco um em cima do outro. Meu pai trabalhou 40 anos e eu já tenho mais de 20 cuidando sozinho dos dois cemitérios. Não posso sair pra lugar nenhum, nem aqui vizinho em Campo do Brito, porque isso não tem hora, e como só sou eu para tudo, fico preso. Esses dias tive que enterrar uma pessoa à noite, às 22h, porque não podia mais ficar no hospital e o juiz deu a ordem. O detalhe é que isso foi feito com uma lanterna. O poste que tinha aqui caiu e ninguém botou mais nada, se não for lanterna, é no candeeiro”.

Para o coveiro, melhorar a situação da falta de espaço nos dois cemitérios de São Domingos, só quando o prefeito entender que isso se trata de uma prioridade, uma vez que já está no limite, perpassando por um problema até de saúde pública. “Em todo mandato é a mesma coisa, ninguém resolve isso. Quando passou de um prefeito para esse outro atual, ele disse que ia melhorar, mas até agora também nada. Eu converso com o prefeito, com o vice, com todos eles. Eles dizem para eu ir ajeitando, dando um jeito, e eu dizendo que não tem mais condições. Nem uma reforma sequer eles fazem. Inclusive, tô pedindo todo dia para recolher um lixo que tem lá na frente, onde bota o caixão e nada”, reclama.

Uma moradora que reside bem próximo a um dos cemitérios, mas preferiu não se identificar, confirma todas as dificuldades e problemas relatados pelo coveiro nos dois cemitérios. “É bem verdade que enterram corpos em covas já usadas por não possuir mais espaço. Isso não é boato. A região inteira já sabe disso há alguns anos e mesmo assim nenhuma autoridade toma providência”.

Outro morador vai ainda mais além com uma queixa grave. Segundo ele, também sem querer dar o nome, já viu inclusive restos mortais serem jogados no lixão da cidade. O Jornal da Cidade foi pessoalmente no lixão conferir a assombrosa informação, porém não encontrou nada, talvez porque o dia estava bem chuvoso e com pouca visibilidade. Fica a denúncia para o Ministério Público averiguar.

O fato vem sendo pauta de cobrança constante na Câmara de Vereadores. Recentemente, o parlamentar Everaldo de Floro (PP), utilizou a tribuna, na sessão 37, para cobrar a reforma dos cemitérios da Cruz da Saúde e sede do município. De acordo com ele, quando ocorrem óbitos, nenhum dos dois cemitérios não têm disponibilidades para que possam enterrar entes queridos e ressaltou que o Executivo necessita comprar terrenos anexos. “Para se cavar uma cova é preciso ser em cima de outra, tirando caixão e restos mortais”, atestou Everaldo.

A cobrança vem por todos os lados e nem parece estar chegando aos ouvidos do prefeito Pedro da Silva. Aliás, o difícil é conseguir falar com ele. O Jornal da Cidade tentou entrar em contato através dos telefones da prefeitura, mas ninguém atende. Inclusive, o celular do prefeito também foram feitas várias tentativas e só se encontrava desligado ou fora de área. Este espaço permanece em aberto para uma possível suíte sobre o assunto na próxima edição, caso o gestor retorne com explicações plausíveis para a população. Com a palavra, o prefeito.

  

 

Fotos: Raphael Faria