23/08/2021 as 08:46

BOLA DE NEVE

Dívidas da prefeitura de Itaporanga com o Tesouro Nacional ultrapassam R$ 70 mi

O problema é que a administração não tem conseguido cumprir com os prazos dos parcelamentos, o que tem levado o município a acumular multas e calotes

COMPARTILHE ESTA NOTÍCIA

As dívidas da prefeitura de Itaporanga D’Ajuda com o Tesouro Nacional alcançaram cifras estratosféricas, nos últimos quatro anos. Entre 2017 e 2020, período que a gestão municipal aderiu ao Programa de Parcelamento de Débitos com a Fazenda Nacional relativos às contribuições previdenciárias (Lei 13485/17), a prefeitura parcelou cerca de R$ 70 milhões em déficits públicos, dos quais pouco mais de R$ 50 Mi apenas em débitos previdenciários. O problema é que a administração não tem conseguido cumprir com os prazos dos parcelamentos, o que tem levado o município a acumular multas e calotes.

Ao todo, já foram pagos pela prefeitura cerca de R$ 6,3 Milhões para quitar essas dívidas, entre débitos tributários, previdenciários e o pagamento de precatórios. Porém, quando se analisa o saldo devedor, nota-se que o montante ao invés de diminuir, na verdade aumentou, saindo de R$ 70 mi para R$ 70,7 mi. “O que temos visto é que todo esse empenho para parcelar as dívidas do município e impedir que a administração fique com certidões negativas em nada está adiantando.

A prefeitura não está conseguindo pagar os parcelamentos em dia e isso tem virado uma bola de neve. Sabemos que essas dívidas são uma realidade enfrentada pela maioria das administrações municipais do país, porém o que não dá é para aceitar que o gestor vá empurrando essa situação com a barriga”, lamenta o vereador de Itaporanga, Ricardo Possidonio (PSD). Em dezembro de 2016, o município registrava 11 dívidas no Sistema de Análise da Dívida Pública, Operações de Crédito e Garantias da União, Estados e Municípios (Sadipen/Tesouro Nacional), que somavam R$ 12,6 Mi. Com a adesão ao Programa de Parcelamentos, em 2017, a prefeitura passou a ter 43 dívidas acumuladas. Além dos pouco mais de R$ 50 milhões avolumados em déficits previdenciários, há, ainda, outros R$ 10 milhões devidos pela prefeitura somente em precatórios, que são dívidas já reconhecidas pela justiça e que, por isso, não cabem mais recursos. Só com esse tipo de dívida, houve um aumento no saldo de devedor de mais de R$ 3 Mi.

HERANÇA MALDITA
Procurado para explicar a situação das dívidas públicas do município, o prefeito Otávio Sobral atribuiu o calote de R$ 70 milhões na dívida ativa da União às gestões de prefeitos anteriores. Ele disse que a atual administração tem se esforçado para assegurar o pagamento dos parcelamentos desses débitos junto ao Tesouro Nacional, mas admitiu que a crise acabou dificultando as condições financeiras do município. “O município fez o parcelamento, conforme as regras estabelecidas, mas como a dívida era volumosa, o município, em certos momentos, teve dificuldade de honrar. Quando há a quebra do pagamento, essa dívida é encaminhada ao PGFN, consequentemente inscrita na dívida ativa, com isso o aumento de dívidas acumuladas. Além de que, com o passar do tempo, a administração foi surpreendida e intimada com diversas outras dívidas anteriores como saldo de Precatórios a pagar junto às justiças estadual, trabalhista e federal, que tiveram que ser negociadas e pagas. Caso não fossem honrados estes acordos, o município poderia até ter seu FPM [Fundo de Participação dos Municípios] bloqueado”, explica o prefeito Otávio Sobral.

Segundo ele, a administração atual herdou uma dívida milionária das gestões anteriores, que é quase impagável. “Na maioria das vezes, ou a administração cumpre com sua obrigação de oferecer saúde, educação, bem-estar social e melhorias para cidade, ou paga dívidas que não foram contraídas por ela. Com a crise financeira que assolou o país e a pandemia da Covid-19, nunca esperada no mundo, os estados e municípios passaram por dificuldades de honrar com suas obrigações”, complementou o gestor. Ainda sobre a situação das dívidas previdenciárias, Otávio Sobral diz que aguarda a tramitação, na Câmara dos Deputados, do Projeto de Lei N0 712/21, que concede parcelamento de dívidas previdenciárias a estados e municípios com o Instituto do Seguro Social (INSS), em débitos vencidos até o dia 31 de janeiro de 2021, incluindo os renegociados anteriormente e ainda não quitados. “Caso aprovado, o município irá aderir ao parcelamento para ver se conseguimos um fôlego fiscal. Lembrando que essa situação é um problema decorrente de estados e municípios em todo Brasil”, conclui o gestor.

Gastos com pessoal aumentaram em R$ 20 milhões durante a gestão de Otávio Sobral

Sem data ainda definida para realização do concurso público, a prefeitura de Itaporanga D’Ajuda segue aumentando as despesas com terceirização, pagamentos de salários e gratificações. Entre 2017 e 2021, período que corresponde à gestão do prefeito Otávio Sobral (PP), o município registrou um aumento nos gastos com encargos pessoais de R$ 20 milhões, saindo de R$ 49 mi, em 2016, para atuais R$ 69,7 Mi. Os dados estão disponíveis no Portal da Transparência do município.

Chama atenção que dos 1.512 trabalhadores lotados atualmente na prefeitura de Itaporanga D’Ajuda, apenas 738 são servidores efetivos. Ou seja, praticamente a metade. Essa situação de inchaço na administração, com cargos comissionados, assim como a identificação de contratações irregulares, levaram o Ministério Público do Estado (MP-SE) a impetrar, no dia 23 de agosto de 2019, uma Ação Civil de Improbidade Administrativa (processo 201971002033) contra o prefeito Otávio Sobral e contra o município de Itaporanga D’Ajuda.

Na mesma ação, o MP-SE também propôs a realização de concurso público para o preenchimento de 500 vagas. O inquérito instaurado na época pelo MP constatou, além do alto número de contratações temporárias, situações em que profissionais efetivos estavam sendo contratados pela prefeitura para atuar em outros programas, a exemplo de um médico que era servidor e estava contratado via PSF (Programa Saúde da Família). Embora tenha sido instaurado em agosto de 2019, o processo ainda caminha para realização da primeira audiência de instrução. Desde que foi agendada pela primeira vez, em 10 de setembro de 2019, a audiência já foi remarcada por seis vezes, por motivos diversos: quando não foi a ausência do magistrado por motivo de cumulação de atribuição, a remarcação foi motivada por questões de segurança sanitária, ou pela falta de condições, apontadas pelas partes, de realização virtual.

Em janeiro de 2020, a juíza da 1a Vara Civil de Itaporanga D’Ajuda, Elaine Celina Afra da Silva Santos, acolheu os argumentos da defesa [Prefeitura de Itaporanga D’Ajuda] e resolveu incluir na Ação a ex-prefeita Maria das Graças Garcez, compreendendo que a ex-gestora também é responsável pela não realização de concurso público no município, assim como pelo alto número de contratações terceirizadas. Vale ressaltar que o último concurso público realizado em Itaporanga foi em 2011, apenas para a área da saúde.

A nova data da audiência de instrução/conciliação/julgamento é 21 de setembro. Procurado para comentar o andamento do processo, o promotor de Justiça, Peterson Almeida Barbosa, autor da Ação que denuncia o prefeito Otávio Sobral de Improbidade Administrativa, e também determina a realização de concurso público para o município, preferiu não se pronunciar. Atualmente, cerca de 55,7% do orçamento da prefeitura de Itaporanga D’Ajuda está comprometido com pagamento da folha salarial, ainda no limite prudencial da Lei de Responsabilidade Fiscal. Se julgada procedente a denúncia de improbidade administrativa, o prefeito Otávio Sobral, assim como a ex-prefeita Maria das Graças Garcez, poderão ser condenados ao pagamento de multa, ter a suspensão dos direitos políticos de três a cinco anos, além da proibição de contratar com o poder público, ou receber benefícios, ou incentivos fiscais, ou créditos.

RESPOSTAS
Questionada sobre o aumento de R$ 20 milhões com gastos em pessoal, a prefeitura alega que “a antiga gestão não tratava os funcionários e as categorias com respeito”. “Hoje, os professores municipais recebem o piso salarial em vigência de 2017 até 2019, além dos níveis de carreira. A mesma situação ocorre com os agentes de saúde e endemias. Também houve a ampliação e contratação de diversos especialistas e equipes na área da saúde, o aumento anual do salário mínimo e, em 2017, enviado pelo executivo e aprovado pela Câmara, houve o projeto de equiparação salarial dos cargos e salários”, destaca a assessoria de imprensa do órgão.

Já em relação ao excesso de contratações temporárias, apontadas pelo MPSE, a prefeitura justifica que boa parte delas está diretamente relacionada ao absenteísmo de servidores, “muitos afastados por motivo de doença, principalmente da secretaria de educação, o que tem causado defasagem no quadro, por isso a contratação de trabalhadores temporários”. Ela lembra, porém, que esses servidores podem retornar há qualquer momento a exercer o cargo. “Além disso, há uma significativa contratação de cargos temporários, vinculados aos programas sociais do Governo Federal e do município. Vale ressaltar que diversos programas estavam paralisados na gestão anterior”.