06/11/2025 as 18:40
MEIO AMBIENTEConsiderada estratégica para o planeta, a região tem influência direta na elevação da temperatura global, e requer não só que se contenha a destruição do bioma, mas que se invista na recuperação da floresta
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A Amazônia pode estar se aproximando de um ponto crítico em que a destruição da floresta provocaria mudanças climáticas irreversíveis, alerta a Climatempo. Às vésperas do início da COP30, que acontece este mês em Belém do Pará, se reacende o alerta sobre o papel decisivo da Amazônia na regulação do clima global. O avanço do desmatamento pode levar o bioma a um ponto crítico, a partir do qual a floresta não conseguiria mais se regenerar –desencadeando um ponto de não-retorno climático.
“Mesmo registrando a redução no ritmo de desmatamento da floresta amazônica, a área total devastada da Amazônia Legal já corresponde a cerca de 20% do bioma. O ritmo diminui, mas a floresta continua sendo derrubada”, ressalta Pedro Regoto, especialista em Clima e Mudanças Climáticas da Climatempo.
A Amazônia é considerada um dos nove pontos de inflexão climáticos (tipping elements) do planeta – sistemas que, ao ultrapassarem determinados limites, podem sofrer alterações abruptas e irreversíveis, afetando o equilíbrio climático de todo o planeta.
No passado, estudos de modelagem apontavam que o tipping point (ponto de não-retorno) da Amazônia era atingir o limite de 40% de desmatamento. Pesquisas mais recentes, no entanto, indicam que o efeito combinado de desmatamento, das mudanças climáticas e do grande uso de fogo na floresta pode levar a um limiar bem mais baixo, entre 20% e 25%. “Isso significa que um desmatamento acima desse patamar nos coloca cada vez mais perto de atingir um limite irreversível de degradação, o que pode levar a floresta a se transformar em savana e causar impactos diretos e irreversíveis sobre o clima global”, explica Regoto.
Além da Amazônia, o conceito de tipping elements, definido em 2008 pelo cientista britânico Timothy M. Lenton, inclui o gelo marinho do Ártico, a camada de gelo da Antártida Ocidental, a circulação termoalina do Atlântico Norte, o fenômeno El Niño no Pacífico Equatorial, as monções asiáticas, as florestas boreais do hemisfério Norte e o permafrost – o solo permanentemente congelado do Ártico.
Segundo Regoto, todos esses sistemas estão interligados. “Quando um deles entra em colapso, pode desencadear reações em cadeia em todo o planeta”, explica. “O degelo do permafrost, por exemplo, pode liberar o metano que está aprisionado há milhões de anos – um gás cerca de 80 vezes mais potente que o CO₂ no efeito estufa. Esse processo acelera ainda mais o aquecimento global e cria um efeito dominó climático, que pode escapar do controle humano”.
No caso da Amazônia, o especialista alerta que o ponto crítico está estimado em 40% de desmatamento. “Se a destruição atingir esse patamar, a floresta pode não conseguir mais se regenerar, dando lugar a uma savana. Esse processo alteraria profundamente o regime de chuvas e a temperatura do planeta”, ressalta.
Por isso, Regoto enfatiza que frear o desmatamento já não é suficiente. “Precisamos investir também na recuperação das áreas degradadas da floresta. Somente assim teremos chance de conter as mudanças climáticas de longo prazo”, afirma.
Os efeitos do aquecimento global já são percebidos no Brasil, com diversos recordes anuais na temperatura média. Em 2024, por exemplo, ela foi de 25,02oC, o que representou um aumento de 0,79oC em relação à média histórica de 24,23oC registrada entre 1991 e 2020, segundo o Instituto Nacional de Meteorologia (INMET).
Os recordes de calor dos dois últimos anos culminaram com desastres climáticos de grande impacto, como as tragédias no litoral norte de São Paulo e no Rio Grande do Sul. “Fenômenos como El Niño e La Niña sempre existiram, mas agora estão mais intensos e frequentes devido às mudanças climáticas”, destaca Regoto. “O aquecimento global é o principal fator que potencializa esses extremos”.
Se o desmatamento da Amazônia e o degelo nas regiões polares continuarem, o planeta pode caminhar para um cenário de transformações irreversíveis. “Chegaremos a um ponto em que a adaptação será muito mais difícil e custosa. Precisaremos lidar com eventos climáticos cada vez mais intensos e frequentes”, alerta o especialista.
A Climatempo reforça que a ciência já oferece evidências claras: conter o desmatamento e restaurar ecossistemas é essencial para evitar o colapso climático. “A Amazônia é o coração climático do planeta. Proteger e recuperar a floresta é proteger a nós mesmos”, conclui Regoto.