30/01/2020 as 14:04

VIOLÊNCIA

35 anos: a idade da angústia das pessoas trans

Brasil ainda é o país que mais mata transexuais no mundo. A maioria, nessa faixa etária

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Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE) apontam que, no Brasil, a idade média que as pessoas concretizam um casamento é de 34 anos. Já para alcançar grandes cargos em empresas, a média varia entre 35 e 40 anos. Quando o assunto é ter o primeiro filho, há um grande percentual de mulheres a partir dos 35, segundo os dados. A idade, que significa a conquista de sonhos de milhares de brasileiros, para as mulheres travestis e transexuais, representa o fim da vida. Isso porque, no país, a expectativa de vida deste público é de 35 anos. E não é raro vê-las sendo ceifadas à força. Tendo o sopro de vida arrancado pela violência.

Um dossiê divulgado essa semana pela Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra) dá conta que, desde 2008, ocorrem, anualmente, 118,5 assassinatos a pessoas transexuais no Brasil. O relatório da Antra aponta, ainda, que no ano de 2019, foram registrados 124 casos. Deste total, 121 vitimaram mulheres transexuais e travestis, e 3 homens transexuais. Número que, conforme relatório, embora grande, culminou com apenas 11 suspeitos identificados -- e somente 7% deles foram presos.

Nele, também é detalhado que “o Brasil segue como o país que mais assassinou pessoas trans do mundo neste período, com 130 mortes, seguido do México (65) e Estados Unidos (31), somando um total de 331 homicídios reportados de pessoas trans em 74 países em todo o mundo”.

A questão racial também é um agravante. Isso também é constatado pelo dossiê da Antra, que mostra que 82% das vítimas eram pretas ou pardas. O que explica, para além dos pontos ligados à transexualidade, mais uma questão ligada à desigualdade social. "A cada 5 dias uma mulher é vítima de feminicídio, enquanto a cada 48h uma pessoa trans é assassinada no Brasil", diz o relatório.

Mortes por arma de fogo, arma branca, apedrejamento, asfixia, atropelamento, carbonização e espancamento fazem parte do relatório, tendo a mutilação corporal presente em 96% dos casos.

Em Sergipe, nomes como Laysa Fortuna, Denise Melo, Madonna, Miliane, Samara, Bruna Medeiros compõem as estatísticas nacionais. E somente dois casos foi julgados e os assassinos condenados.

Contrariando a expectativa imposta pelos números, a ativista transfeminista Linda Brasil, de 46 anos, se considera uma sobrevivente. E, para ela, o assunto ainda não é tratado com a devida importância, por isso, de acordo com análise dela, as mortes de travestis e transexuais continuam existindo e seguem, em sua maioria, subnotificadas.

"A gente percebe que, pelo fato de estarmos ocupando alguns espaços e denunciando essa invisibilidade, alguns efeitos estão surtindo. E acredito, por várias questões, principalmente por causa de eventos como a 6ª Semana da Visibilidade Trans, em médio e longo prazo, esses números mudem. Mas precisamos ocupar os espaços negados e, somente assim, mudaremos essa realidade. O recorte racial também é um reflexo desses números. Mas, a questão da subnotificação tem relação direta com o trabalho da imprensa. Porque todos os dados são feitos com base em matérias jornalísticas e, quando não se noticia, não tem como catalogar. Sabemos que nem todos os casos são noticiados e o governo atual também não se interessa com esses números, porque não tem interesse em aplicar políticas públicas. O estigma sobre as pessoas trans é muito grande. As pessoas não conseguem entender a identidade de gênero, as religiões nos associam ao diabo e isso acaba refletindo na violência recorrente. A falta de informação e a negligência acabam sendo potencializados pelo discurso religioso. As pessoas distorcem à palavra de Jesus, que é amor, e o que vemos é a deslegitimação de nossas identidades”, pontua.

A Semana da Visibilidade Trans citada pela ativista começou ontem, 29, e segue até o dia 1º de fevereiro, é um dos mais importantes eventos no tocante à inclusão do público. Realizado há seis anos na capital sergipana, foi instituído em 2004 para lembrar o dia em que pessoas trans e travestis foram à Brasília, pela primeira vez, lançar a campanha “Travesti e Respeito”, junto ao Congresso Nacional. A Semana da Visibilidade Trans, citada pela ativista, começou ontem, 29, e segue até o dia 1º de fevereiro, é um dos mais importantes eventos no tocante à inclusão do público. Realizado há seis anos na capital sergipana, foi  instituído 2004 para lembrar o dia em que pessoas trans e travestis foram à Brasília, pela primeira vez, lançar a campanha “Travesti e Respeito”, junto ao Congresso Nacional.

A abertura foi realizada na CasAmor, primeiro espaço destinado a acolher pessoas LGBTQI+ em situação de vulnerabilidade social e em situação de rua de Sergipe.

Por John Santana/Da equipe JC 

||Fotos: Divulgação/Arquivo pessoal