12/02/2020 as 08:57
JustiçaLaudo da Embrapa aponta para declínio das lavouras de cana de açúcar por conta do particulado salino lançado pela empresa
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Um grupo de proprietários de terra, mais especificamente plantadores de cana de açúcar, da região de Rosário do Catete, distante 40 km da Capital, trava uma batalha judicial contra a empresa Vale que, em alguns casos, que já perdura há mais de 20 anos.
Isso mesmo. Esses donos de terra perceberam queda na produtividade após a chegada da extinta Companhia Vale do Rio Doce às imediações de suas propriedades e decidiram buscar, judicialmente, uma reparação de danos.
Um exemplo é a Fazenda Capim-Açu/Bom Nome, que sempre se destacou pela alta fertilidade de seu solo e após a chegada da empresa amargou, segundo o proprietário, queda abrupta na produção de cana devido ao processo de produção do fertilizante cloreto de potássio.
Inicialmente, o proprietário, Cristiano Barreto Júnior, entendia ser conveniente, por motivos de infraestrutura e segurança, ter a empresa Vale como sua limítrofe, porém, o tempo foi inimigo do senso comum e revelou graves danos.
Segundo ele, a quantidade de particulado salino lançado por meio eólico comprometia as plantas, os solos e toda a infraestrutura de sua propriedade, inclusive, oxidando o maquinário da fazenda.
A ação movida por ele contra a Vale já foi julgada e a empresa condenada a pagar uma quantia indenizatória a título de ressarcimento de danos. Apesar disso, o valor ainda não foi pago em sua totalidade.
“Os danos sofridos encontram-se na vegetação, no solo e nos elementos de serventia. A quantificação dos prejuízos envolve a queda quase que total de produtividade dos canaviais afetados pelo particulado salino, a esterilização de manchas descontínuas de solo, a descaracterização do solo onde sempre foi tradicionalmente área canavieira e a desvalorização da área remanescente”, apontou o advogado de Cristiano Barreto na ação, Juvenal Francisco da Rocha Neto, quantificando em 24 toneladas a menos na produção, além da perda em 20% da bonificação de sacarose.
Vale ressaltar que o processo teve início em 1997 e esses danos puderam ser comprovados através de laudos realizados por órgãos creditados para tal, a exemplo de um deles realizado pelo pesquisador da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), David Soares Pinto.
“O resultado, todavia, é um declínio na produtividade das lavouras, no caso a da cana de açúcar. À medida que se afasta da fonte do particulado, os efeitos vão-se diminuindo até tornarem-se nulos. Máquinas, implementos agrícolas, motores e aparelhos que possuem componentes metálicos não devem ser guardados ou armazenados na área de deposição do particulado em razão de sua ação corrosiva”, apontou o laudo da Embrapa à época.
Além da concentração inaceitável do cloreto de potássio, os índices de contaminação do solo por sódio, cálcio e magnésio, também despontaram como extremamente elevados, chegando a ser o dobro e o quíntuplo, respectivamente, dos limites tolerados pela ciência agronômica.
Para outro proprietário de terra da região, que prefere não ser identificado, mas que também ingressou há algum tempo com uma ação contra a mineradora Vale, os danos vão além das questões materiais.
“A exploração feita pela Vale lá atrás e agora repassada para a Mosaic Fertilizantes joga poeira tóxica no ar e, mais do que causar danos à propriedade rural, patrocina um enorme dano ambiental. Os danos não se restringem a prejuízos nas atividades econômicas desempenhadas, mas se projetam no próprio ecossistema da região”, afirma o produtor rural.
Em agosto de 2017, a empresa Mosaic Fertilizantes, maior produtora global de fosfatados e potássio combinados, adquiriu a Vale Fertilizantes por um valor de U$ 2,5 bilhões. À época, a empresa já operava com capacidade de produção de mais de 500 mil toneladas de minério por dia. Com a compra, a Mosaic herda também os passivos judiciais referentes a esses danos.
Questionada sobre as informações postas na reportagem do JC, a Mosaic Fertilizantes afirmou que sua operação está em conformidade com as medidas propostas pelos órgãos ambientais responsáveis e que qualquer anomalia é imediatamente informada à Administração Estadual do Meio Ambiente (Adema) para que as medidas cabíveis sejam tomadas.
A empresa disse ainda que realiza o acompanhamento dos danos causados a essas propriedades, em conformidade com as recomendações estabelecidas pela Adema. Além disso, ela acrescenta que não despeja poluentes e suas operações produzem cloreto de potássio, tendo como rejeito o cloreto de sódio, substância não tóxica, que é descartada dentro dos parâmetros legais e conforme licença ambiental de operação, a fim de evitar qualquer dano ao meio ambiente.
No tocante aos processos indenizatórios, a Mosaic Fertilizantes pontuou que não comenta sobre processos que estão em andamento.
Fotos: Divulgação